Um grão de semente contém em si os princípios de uma dupla viagem: da raíz que se fundamenta na terra, do tronco que conquista o céu. Uma mão sobre uma folha de papel vazia procura o encontro nesses espaços em branco...

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Que sonhos Deus terá para nós?

O dilema de uma mão sobre uma folha em branco... Que letras escrever? Uma tela enorme... que imagens projectar? Uma paisagem branca cortada pelo silêncio... que vidas sonhar?

É nessa plasticidade que Xavier Beauvois filma - sem pressas e nos ritmo e movimento adequados - esses encontros entre homens e deuses. Vários homens, a caminho de um início desconhecido, percorrem um caminho gélido atravessado pelo vento onde o branco da neve até à vegetação se impõe... Que quis Deus daqueles homens?

Uma comunidade de monges trapistas numa Argélia onde tudo lhe é negado. Menos o estarem presentes na comunidade. Nas consultas médicas gratuitas, nos conselhos pessoais, na solidariedade dos pequenos gestos, na oração com os irmãos muçulmanos, na vivência com os supostos inimigos ...somos chamados para servir aqui ... E aqui se entroncam chamando a si as aves em seu redor e descobrindo que Deus fecunda as flores no local onde elas estão.

E face externalismos ameaçadores (terrorismo) fazem esse caminho de descoberta de liberdade interior - partir é morrer; não tenho medo de morrer. Sou um homem livre. No final essa certeza de que descobriram um amor ainda maior do que qualquer amor terreno.

E por fim este mistério... do convite a uma constante renovação na certeza de que de nascença em nascença trazemos para dentro nós o que nos faz mais semelhantes a Cristo.

Que sonhos Deus terá para nós?


Testament spirituel du frère Christian


"QUAND UN A-DiEU S'ENVISAGE..."


S'il m'arrivait un jour - et ça pourrait être aujourd'hui -


D'être victime du terrorisme qui semble vouloir englober maintenant


Tous les étrangers vivant en Algérie,


J'aimerais que ma communauté, mon Eglise, ma famille,


Se souviennent que ma vie était DONNEE à Dieu et à ce pays.



Qu'ils acceptent que le Maître unique de toute vie


Ne saurait être étranger à ce départ brutal.


Qu'ils prient pour moi :


Comment serais-je trouvé digne d'une telle offrande ?


Qu'ils sachent associer cette mort à tant d'autres aussi violentes


Laissées dans l'indifférence de l'anonymat.


Ma vie n'a pas plus de prix qu'une autre.


Elle n'en a pas moins non plus.


En tout cas, elle n'a pas l'innocence de l'enfance.


J'ai suffisamment vécu pour me savoir complice du mal


Qui semble, hélas, prévaloir dans le monde,


Et même de celui- là qui me frapperait aveuglément.



J'aimerais, le moment venu, avoir ce laps de lucidité


Qui me permettrait de solliciter le pardon de Dieu


Et celui de mes frères en humanité,


En même temps que de pardonner de tout cour à qui m'aurait atteint.



Je ne saurais souhaiter une telle mort ;


Il me paraît important de le professer.


Je ne vois pas, en effet, comment je pourrais me réjouir


Que ce peuple que j'aime soit indistinctement accusé de mon meurtre.



C'est trop cher payé ce qu'on appellera, peut- être, la « grâce du martyre »


que de la devoir à un Algérien, quel qu'il soit,


Surtout s'il dit agir en fidélité à ce qu'il croit être l'islam.


Je sais le mépris dont on a pu entourer les Algériens pris globalement.


Je sais aussi les caricatures de l'islam qu'encourage un certain islamisme.


Il est trop facile de se donner bonne conscience


En identifiant cette voie religieuse avec les intégrismes de ses extrémistes.



L'Algérie et l'islam, pour moi, c'est autre chose, c'est un corps et une âme.


Je l'ai assez proclamé, je crois, au vu et au su de ce que j'en ai reçu,


Y retrouvant si souvent ce droit-fil conducteur de l'Évangile


Appris aux genoux de ma mère, ma toute première Eglise,


Précisément en Algérie, et, déjà, dans le respect des croyants musulmans.


Ma mort, évidemment, paraîtra donner raison à ceux qui m'ont rapidement


traité de naïf, ou d'idéaliste :


« Qu'il dise maintenant ce qu'il en pense ! »


Mais ceux-là doivent savoir que sera enfin libérée ma plus lancinante curiosité.



Voici que je pourrai, s'il plaît à Dieu, plonger mon regard dans celui du Père,


Pour contempler avec lui ses enfants de l'islam


Tels qu'il les voit, tout illuminés de la gloire du Christ,


Fruits de sa Passion, investis par le don de l'Esprit


Dont la joie secrète sera toujours d'établir la communion


Et de rétablir la ressemblance, en jouant avec les différences.



Cette vie perdue, totalement mienne, et totalement leur,


Je rends grâce à Dieu qui semble l'avoir voulue tout entière


Pour cette JOIE-là, envers et malgré tout.


Dans ce MERCI où tout est dit, désormais, de ma vie,


Je vous inclus bien sûr, amis d'hier et d'aujourd'hui,


Et vous, ô amis d'ici,


Aux côtés de ma mère et de mon père, de mes sours et de mes frères et des leurs,


Centuple accordé comme il était promis !



Et toi aussi, l'ami de la dernière minute, qui n'aura pas su ce que tu faisais.


Oui, pour toi aussi je le veux, ce MERCI, et cet « A-DIEU » envisagé de toi.


Et qu'il nous soit donné de nous retrouver, larrons heureux,


En paradis, s'il plaît à Dieu, notre Père à tous deux. AMEN !



Incha Allah !



Alger, l décembre 1993


Tibhirine. l janvier 1994

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O meu Concerto de Natal (2010)

Pela dificuldade de ir ver, neste Natal, um ao vivo acabei por ir ver este filme-concerto. Algures, no início, diz-se que o que se vai contar é baseado numa história verídica. E que bom é quando o cinema nos conta histórias assim de busca do sonho e auto-superação com humor e dramatismo bem doseados.

Às escondidas, do 1º balcão, Andreï Filipov (Aleksei Guskov) dirige a orquestra de Bolshoï até o seu telemóvel interromper o verdadeiro ensaio. Da reprimenda percebe-se que aquele antigo – grande - maestro da era Brejnev é agora um simples empregado de limpeza. Que por curiosidade, equívoco ou simples vontade de vingança desvia um fax-convite do Teatro Châtelet. Que, por loucura, engendra o plano de reunir os velhos amigos músicos, também eles afastados da Orquestra, e levá-los a Paris.

E começa aí a viagem e aventura. Reticências e dúvidas no início mas sobretudo desejo de novidade leva a maioria a abarcar nessa Argo que os levará de uma Moscovo confusa – entre um novo-riquismo mafioso e um saudosismo comunista que teima em permanecer – à mítica Paris. Bem filmada pelo romeno Radu Mihaileanu esta comédia de desenganos: o francês macarrónico do antigo-inimigo-KGB-transformado-em-novo-agente; as exigências desactualizadas do lado russo; o cumprimento das informalidades de embarque através do esquema ‘tenha agora mesmo um visto e um passaporte aqui no aeroporto; as confusões na chegada a Paris; a fuga dos músicos que adivinharam, talvez, nessa viagem uma hipótese de fuga da Mãe-Rússia…

Mas há depois a obsessão por Tchaikovski ( e o magnifico Concerto para D Major, op 35); há a elevação da perfeição contida numa nota só. Foi por isso que maestro lutou ao lado dos seus amigos judeus. Defronta agora o passado pela mão da virtuosa Anne-Marie Jacquet (Mélanie Laurent)…E depois de um início desastroso, a catarse dá-se com a orquestra e solista a atingirem a harmonia absoluta, a tal pela qual vale a pena lutar…

E mesmo que seja tudo tão mirabolante (como consegue um bando de músicos antigos, sem ensaios, com instrumentos novos tocar tão bem?!) é bom haver ainda numa época marcada pelo excesso de informação, histórias que remetem para o campo onírico da realidade onde os sonhos se concretizam.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Os miúdos ficarão bem....

Os miúdos estão bem? Aparentemente sim. Lisa Cholodenko (realizadora e argumentista) tenta normalizar neste filme uma família nada convencional: duas senhoras de meia-idade, casadas uma com a outra, com uma filha e com um filho adolescentes gerados por cada uma das mães com o esperma de um dador anónimo Confuso?


Os miúdos estão bem? Aparentemente os problemas são os de todos. Nic (Annette Bening) é uma médica de sucesso, um pouco controladora por ser o garante financeiro da casa o que lhe faz pensar que pode ser ela a ditar as regras. Jules (Julianne Moore) é a mãe que abdicou da carreira profissional para ficar em casa a tratar dos filhos e que, após estarem criados, tenta retomar um trabalho com o que isso implica de nova adaptações no seio familiar. Joni (Mia Wasikowska) vive a apreensão própria de uma adolescente prestes a soltar as asas do ninho familiar com a ida para a universidade; Laser (Josh Hutcherson) é um miúdo de 15 anos, que preocupa as mães por causa do amigo rufia. É dele a (natural??) curiosidade de conhecer o pai biológico, Paul, (Mark Ruffalo), dono de um restaurante e solteirão.


Os miúdos estão bem? Estão. OU não!! Percebe-se que houve verdade sobre a forma como foram gerados, que nada lhes foi escondido durante a sua educação. Mas o conhecimento do pai …há uma mãe perturbada com a complexidade da sua sexualidade, há uma empatia com o bio-pai (???) por causa desse laço biológico mas uma confusão sobre como gerir a entrada dele nas suas vidas e se há mesmo vontade de fazer crescer essa relação. E há um homem atrapalhado com a descoberta de uma suposta família que não sendo sua, tenta, sem sucesso, resgatar para si.


Os miúdos estão bem? Sim. Sente-se que foram criados com amor, esse amor que acaba por vencer mal-entendidos e traições. E como Laser dirá…vocês já são muito velhas para se divorciarem…


Os miúdos estão bem? Sim. Cresceram numa família que tal como todas as outras não é perfeita nem normal porque a definição desses conceitos é muito flutuante….A questão que se poderá colocar é a de saber se temos o direito de experimentar novos tipos de relacionamento. Mas mesmo que alguns deles me causem alguns pruridos e bastantes interrogações, tenho de admitir que é isso que, enquanto sociedade, temos feito ao longo do tempo.


(Os Miúdos estão bem tem 4 nomeações para os Globos de Ouro – melhor filme musical ou comédia, melhor argumento, melhor actriz de comédia ou musical [Annette Bening e Julianne Moore]. A seguir o caminho que fará nos Óscares. O filme não deveria não ser considerado uma comédia …Annette Bening merece a nomeação para Actriz Principal).


quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

RED Retired Extremely dangerous

RED é um daqueles filmes de puro entretenimento ganhando originalidade sobretudo por incluir no seu elenco actores/actrizes normalmente não associados a filmes de acção que RED supostamente também é.


Bruce Willis [Fran Moses] encabeça esse elenco, no papel de um agente da CIA reformado que bem podia ser o envelhecido John McClane de Die Hard. Frank Moses combate a solidão rasgando os cheques da Segurança Social para assim ter desculpas para telefonar à sua Assistente Social [Mary-Louise Parker] , personagem aborrecida com a monotonia da sua vida quotidiana fantasiando aventuras com mais adrenalina do que o seu trabalho administrativo…

Até aqui nada de novo …


Depois o desenrolar habitual deste tipo de enredo. O passado regressa, há golpes de defesa pessoal, explosões de casas, … Para se proteger a si e à sua amada-para-ser, Frank regressa ao activo..


Até aqui nada de novo ….


Há cenas cómicas de mal-entendidos nos primeiros encontros entre os amados-para-ser, há perseguições de carros, há carros a rodopiarem à distância milimétrica das pernas de Frank enquanto este dispara,… Há reencontros com velhos amigos (o lunático John Malkovich e malandro Morgan Freeman) antigos colegas à espera de se desaborrecerem da sua vida de reformado. Há conversas de espiões russos, há assalto ao quartel –general da CIA… a fantasia de um filme de acção está lá toda


Até aqui nada de novo! E depois? Depois uma verdadeira dama junta-se à pandilha… Por debaixo dos seus muito britânicos hábitos de servir chá e bolos e cuidar das suas rosas, uma arma escondida. E só Helen Mirren para, com a sua fleuma britânica, afirmar I kill people dear.


E a verdadeira acção passa a estar centrada nela, no seu glamour, no requinte com que constrói a personagem de uma assassina altamente treinada que colocou sempre o serviço à frente da sua vida pessoal sacrificando o seu amor por um espião russo. A elegância de Helen Mirren denota bem o seu profssionalismo.


RED é um filme leve de entretenimento por se adivinhar o bom gozo que actores consagrados devem ter tido ao fazê-lo. E ao perpassarem esse sentimento para fora da tela quem ganham são os espectadores.


(vi este filme a 15 de Novembro na Guarda aproveitando uma deslocação de âmbito profissional)